Introspectiva 2009

por Robson Assis | | 31.12.09 COMENTE!

Não consigo classificar 2009 como um ano bom, nem como um ano ruim. Foi um ano muito estranho, isso sim é inegável. Conheci dívidas que nunca pensei ter, frequentei lugares que não esperava e abandonei uns parâmetros de vida que achei que me atrapalhavam, mas que hoje se mostram tão necessários quanto o ar que respiro.

A poesia, a discórdia, a opinião truculenta saltando nas veias. Eu perdi, de certa forma, a ânsia por tudo quando deixei essas coisas de lado. Abandonei meu antigo emprego para outro parecido, mas bem menos entediante, com pessoas mais maduras e que cuidam mais de suas próprias vidas.

Primeiro ano com a namorada. Uma pessoa especial, inteligente demais, - sempre perco discussões com ela, até quando falamos de Racionais - linda e que me faz pensar nessas paradas sobre o futuro. Passamos por momentos difíceis este ano e espero que tenhamos mais sabedoria e coragem no ano que começa amanhã. (É bom / Às vezes se perder / Sem ter porquê / Sem ter razão / É um dom / Saber envaidecer / Por si / Saber mudar de tom).

Enfrentar o que se passa na sua cabeça não é uma das metas mais legais de se colocar numa lista metas para o ano novo, mas é uma decisão um tanto sensata.

Fiquem com os melhores vídeos de 2009, e que 2010 seja um ótimo ano a todos nós.

Black Eyed Peas tocando seu hit I got a feeling na festa de aniversário da Oprah. Realmente incrível, talvez o maior Flash Mob de 2009, senão o maior, pelo menos o mais emocionante.


A música mais tocada na Inglaterra de acordo com a empresa de licenciamento PPL. Chasing Cars é uma excelente música, com o clima que o Snow Patrol se acostumou a fazer.


Rock And Roll, executada pelo Foo Fighters com a participação de Jimmy Page e John Paul Jones, integrantes originais do Led Zeppelin.


You Make My Dreams Come True, da excelente trilha sonora de 500 dias com ela. Uma música que lembra sábados de sol, felicidade e essas coisas que morreram nas comédias românticas


Abertura de Watchmen, com Times are changing, do Bob Dylan. Cenas históricas, com os minutemen do melhor filme baseado em quadrinhos que já vi. Queria postar o vídeo do filme, mas o youtube proibiu a incorporação a blogs. Segue abaixo a canção original e aqui o link do vídeo com a introdução do filme.

Jay-Z, Sir

por Robson Assis | | 29.12.09 COMENTE!

Conheci o trabalho de Jay-Z através de uns artistas da Roc-A-Fella, sua própria gravadora, no começo da década 00. Certa vez, de bobeira em casa e zapeando canais, caí num Telecine qualquer que passava o documentário Fade to Black, sobre a vida do rapper, com cenas reais dele em estúdio, gravando o The Black Album, um dos últimos grandes discos antes da derrocada da música pop e da avalanche de batidas e samples eletrônicos, chatos e sistemáticos.

Sinceramente, depois desse trecho do filme (abaixo), fiquei empolgado por ouvir tudo o que o rapper fez até então e o que faria dali pra frente. Claro, não sem antes pensar na possibilidade de ser uma jogada publicitária afim de exaltar um dos maiores ídolos de hip-hop do mundo. Preferi acreditar que ele é melhor rapper que ator. E ficamos bem assim.

Com vocês, Sir Shawn Corey Carter (ou seria melhor dizer Shawn Knowles Carter?), JAY-Z!

Solidões necessárias

por Robson Assis | | 27.12.09 COMENTE!

Preciso dos dias e tardes
Nem que chova
Nem que morra
Prefiro o conforto das falsas liberdades.
Existe algo simples
Mas que poucos podem discernir
Liberdade näo é fazer o que se quer
Está em poder simplesmente existir.

Os melhores raps nacionais dos anos 00 - parte II (definitiva)

por Robson Assis | | 19.12.09 1 Comentário

A segunda e definitiva parte dos melhores do rap nos anos 00. Foi uma difícil seleção de músicas e, sem dúvida ficaram de fora outros grandes clássicos da primeira década do novo milênio, mas fica a certeza de que rolou muita música de qualidade e idéias sinceras.

Fiquem com a mixtape! E confiram também a primeira parte.



A FIRMA - ÁFRICA
Uma música EXCELENTE, para não economizar adjetivos. Obviamente fala sobre escravidão e preconceito, e termina com um dos melhores discursos do Thaíde.

"Mas se liga, a coisa não mudou muito e a parada é daqui pra frente
Tirando a corrente e o tronco a situação não é muito diferente
O que era Quilombo hoje é chamado favela
O conceito de igualdade para o povo já era
A polícia mata de um lado e o governo bate do outro
E a gente sempre acorda com a corda no pescoço
Mas, calma aí, seu moço, pra que o desespero?
O giz é branco, mas não ensina nada sem o quadro negro"

GOG - O AMOR VENCEU A GUERRA
Uma história heróica, cantada pelo poeta de Brasília, em uma batida simples e verdadeira, com muito sentimento. A trilha de fundo, do Legião Urbana é de arrepiar.

"A semana toda passei agoniado
Lá estava eu, madrugada de sábado
O encontrei no jardim aguando as plantas
Ali mesmo tivemos uma conversa franca
Ali mesmo ensopei minha camisa branca
Me senti aliviado, tirei um nó da garganta
A violência com atitude impensada gera
Não sou mais um entre a ganância e a capela"

SABOTAGE - MUN-RÁ
Optei não colocar nenhuma do disco Rap é Compromisso, deixei para uma possível lista de intocáveis do rap. Essa música define o Sabotage. Ele era esse rapper que ironizava o mundo em sua rima, falava de seus filhos e sobrinhos, é quebrada e sabe exatamente a que veio.

"Se liga na fita danados otários estão maquinados no morro
falaram que pode atirar na sequência se pa vão prestarem socorro
mas abre olho, o cara piolho, é sempre um mano dos nossos
o inimigo meu tem Astra, Barca, Blazer, também tem Moto"

MV BILL - SOLDADO DO MORRO
Acredito que um sociólogo não faria melhor descrição do tráfico nos morros do Rio de Janeiro como o rapper faz nessa música. A batida cria camadas densas de um discurso político pesado.

"Tô ligado bolado quem é o culpado?
Que fabrica a guerra e nunca morre por ela
Distribui a droga que destrói a favela
Fazendo dinheiro com a nossa realidade
Me deixaram entre o crime e a necessidade"

RACIONAIS - VIDA LOKA (pt. I e II)
Como disse nesse texto aqui, o grupo deu uma desritmada com o Nada como um dia após o outro dia. Mas isso não os livrou de lançar esta epopéia. As duas partes de Vida Loka definem o Capão Redondo e o sentimento que Mano Brown tem por sua quebrada e seus amigos. Merecem ser uma só.

"Meu melhor Marvin Gaye, sabadão na Marginal
O que será, será, é nóis vamo até o final
Liga eu, liga nóis, onde preciso for
No Paraíso ou no dia do Juízo, Pastor
E liga eu e os irmão
É o ponto que eu peço,
Favela, Fundão, imortal nos meus versos"

EDI ROCK E SNJ - NÃO SEJA MAIS UM PILANTRA
Do disco solo do Edi Rock. Sim, o rapper tem um disco solo pouco conhecido com participações e uma segunda versão de Rapaz Comum, do Sobrevivendo no Inferno. Esse som, com participação do SNJ, tem uma batida tensa e fala sobre a decadência de um viciado.

"Sobrevivente aqui é você que menos culpa tem
Quem vem dar ajuda quando você precisa?
Maluf ama São Paulo, o povo veste a camisa
Se lugar de bandido fosse na cadeia
Ele estaria atrás das grades numa cela cheia
Ia ser réu comum, digno de dó
Só, mano ia ficar só o pó"

DEXTER - FÊNIX
A imprescindível alfinetada no antigo parceiro de grupo do rapper saiu no disco Exilado sim, Preso Não, de 2005. Letra ácida e desafiadora.

"6 meses em Bernardes me fez entender
Que o pior cego é o que não quer ver
Mas eu vi e percebi, descobri quem é quem
Hoje sei quem chegou quando precisei"

THAÍDE & DJ HUM, RZO, SNJ e Xis - ASSIM CAMINHA A HUMANIDADE
Quatro "monstros consagrados" (Faustão detected) do rap nacional. Por conta de tanta participação, a música passa por vários momentos, com uma batida muito boa em que cada rapper adapta ao seu estilo de rima. Na lista das músicas essenciais.

"Eu ouço uma sirene, desespero,
Colei na grade e não gostei do que vi pelo espelho
Os manos impacientes, descontrolados
Chegou a hora acabou foi o que deu no rádio"

APOCALIPSE 16 - MUITA TRETA
Estava na dúvida, mas depois de ouvir a mensagem dessa música, optei por ela. É a base do rap nacional como se fazia antigamente, fala sobre drogas e até discursa sobre a hipocrisia do rap. Com participação de WDee, do Consciência Humana.

"O sonho que não se realiza, poder matando vidas
Controle da população, criação de homicidas
O compasso seduz, peço paz, chamo a luz
O meu caminho é guiado por CH e um homem chamado Jesus"

SNJ - PENSAMENTOS
Uma música que me emociona só de lembrar. Mistura crença, esperança, com uma dose gigante de verdade, que parece ser o compromisso do grupo.

"Parei para refletir, e viajei,
Fatos do passado vários que não acreditei,
Como é bom guardar na recordação.
Independente de tudo aprender a lição"

Os melhores raps nacionais dos anos 00 - parte I

por Robson Assis | | COMENTE!

A primeira parte da lista das melhores músicas de rap nacional da década.



509-E - SAUDADES MIL
Se fosse uma lista de músicas mais representativas, sem dúvida a escolhida seria Oitavo Anjo, também um ótimo som. Mas essa música conta uma história, uma carta respondida, tem mais sentimento, é mais verdadeira.

"É foda, a vida é assim mesmo
Nem tudo é do jeito, do modo que queremos
Infelizmente retroceder não dá mais
Bola pra frente é assim que se faz
Jorge cantou que Charles ia voltar
E como Charles eu também pode acreditar
Com este dia não paro de sonhar
Quero ver o morro inteiro feliz e pá"

CONEXÃO DO MORRO - SUPER BILLY
Se um dia, num futuro muito distante, encontrarem essa música em algum arquivo MP3, vão entender exatamente como era a vida de um adolescente de cabeça vazia e influenciável na periferia das grandes cidades. Uma história triste, mas muito sincera.

"Ao passar do tempo Billy se recupera
Tira a colher debaixo da língua e vai buscar uma pedra
Pra você ver Billy no role é normal sair na captura de 1 real
Sem dinheiro no bolso tem maluco que passa mal"


FACÇÃO CENTRAL - MENINO DO MORRO
Um grupo não só polêmico. Ninguém consegue ser só polêmico quando lança 4 discos com cutucadas viscerais ao governo e ao modus operandi do sistema. Música aboslutamente genial, sobre um garoto que se deu bem com o crime. O Facção Central nunca lançou um som sequer em que o ouvinte não tenha que parar e refletir.

"Dou risada de quem acredita na justiça,
Mais fácil camelo na agulha do que eu na delegacia
Sou traficante intocável pro tribunal
Que no foguete da NASA faz safári sideral,
Tô na lista vip dos cassinos clandestinos,
Quer ser presidente, traz a campanha que eu financio"

XIS - DE ESQUINA (VERSÃO BRISA)
"Esquina paranóia delirante" é um refrão que tocou durante anos na minha mente. Essa "versão brisa", do disco Seja como for é fascinante e esteve até no set do acústico da Cássia Eller.

"A esquina é perigosa atraente
Nossa quanta gente, que movimento interessante
Um carro desse o outro sobe pro boite do Natal
Pra 11 esquinas da Cohab 2
Todo mundo a vontade, cuidado, mano que é mano tá ligado
Chega como eu cheguei, fica como eu fiquei,
Faz como eu fiz... eu sou o Xis"

SP FUNK - FÚRIA DE TITÃS
O grupo me mostrou um tipo de rap mais simplista, rimas carregadas de analogias engraçadas e sutis, numa linha bem rinha de MCs, vale a pena escutar.

"Me passa o microfone eu faço logo um improviso
Te boto no chão faço como no jiu-jitsu
Por que comigo o verbo é fluente ao natural
Vacila na minha eu te mastigo como um canibal."

TRILHA SONORA DO GUETO - 3a OPÇÃO
Primeira música que ouvi deste grupo. A batida e a letra são tão tensas quanto o clima de que algo vai explodir a qualquer momento.

"Ai xará é o seguinte eu só vou me entregar
Quando aquele sem futuro do Datena me filmar
Tô ligado que pra vocês eu não 'valo' um real
Só que vocês invadirem o refém vai passa mal
Ele tá todo borrado, tá mijado, tá com medo
Tá pagando até com juros o racismo e o preconceito"


AO CUBO - 1980
Confesso que sempre tive certo receio com grupos de rap gospel, mas ao Ao Cubo entrou na lista dos que realmente têm algo a dizer. Canção autobiográfica e uma das mais belas já escritas. Vale prestar atenção no clímax da emocionante versão ao vivo.

"Ficou muito rebelde em meio sua adolescência,
Começou a usar drogas por más influências
Mas num certo dia por um sonho sua vida ia mudar
Pois Deus estava prestes a por seu plano em prática"

RAPPIN HOOD - RAP DU BOM (pt. II)
Com participação de Caetano Veloso, considero um épico. Dançante, bem escrita e possui uma melodia sensacional no violão. A música ainda emprestou o nome para do programa do rapper, na rádio 105FM, de São Paulo.

"Saiba você que eu encontrei uma melhor saída
No hip hop conheci o meu estilo de vida,
Que não é pop, não faz pose, não faz cara de mal,
Mas não da boi pra mauricinho, intelectual"

MARCELO D2 - A MALDIÇÃO DO SAMBA
Pelo rapper que foi, Marcelo D2 merece estar nessa lista com a melhor canção do A Procura da Batida Perfeita - disco que fez uma clara alusão pouco criativa ao clássico do Afrika Bambaata Looking for The Perfect Beat e que me fez perder o gosto pelo som deste artista. Mas essa música em especialtem classe, pompa, mashup de samba de velha guarda com rap em grande estilo.

"E sangue bom, eu disse sangue bom
Tem coisas que invadem o coração já disse o João
Não, ninguém faz samba porque prefere
Sobre o poder da criação força nenhuma no mundo interfere"

JIGABOO e CHARLIE BROWN JR. - VAI PIRAR
Depois do sucesso de Corre-Corre, o Jigaboo ganhou minha atenção total. Lançaram essa música com participação do Chorão (Charlie Brown Jr.) que até não errou tanto na criação da letra. PMC e Suave indiscutivelmente grandes rappers esquecidos pelo tempo. O diferencial é que a música mistura rap e rock sem pender pra nenhum dos lados.

"Quem foi que disse que isso é uma loucura
Que raça pura? A gente gosta mesmo é de mistura
Rap, rock e hip-hop só quero que toque
Não importa se otário me chamar de pop"

Uns restos de mim

por Robson Assis | | 16.12.09 COMENTE!

É dezembro. Estou com o carro parado na frente de uma lavanderia vendo ternos no cabide. Ternos entre a chuva espessa, milimetricamente despojados e contemporâneos. São pessoas que os usam. Pessoas que eu não conheço e, certamente, tem prioridades menos febris e preocupantes que as minhas. Sou um cidadão do mundo, endividado, encurralado pela máquina. Movido a sorrisos sem graça e horas de diversão fingida. Movido ao tédio que é meu nome, simples e puro, meu único significado. Eu torno a me jogar dentre os ternos, camisas brancas, gente falsa, gente falsa numa só falácia. Eu entendo, nada me leva daqui, nunca. Se eu soubesse que estaria deprimido e sozinho, olhando a vitrine de uma lavanderia hoje, talvez eu tivesse escrito melhor minha vida. Quando era moleque e ingênuo, me perguntava "até quando?" e me sentia numa pequena ilha, um pequeno príncipe beat, que carregava a solidão e a bebedeira na mochila. Hoje minha ilha cresceu, é imensamente maior e eu ainda estou sozinho, aprendendo a entender como foi que meus dezembros se tornaram tão chuvosos e tristes.

VIII Feira Preta Cultural

por Robson Assis | | 11.12.09 COMENTE!

Vou deixar que o site oficial da feira fale por si só:

A Plataforma Cultural Feira Preta é um espaço de celebração, reflexão e inquietação do movimento cultural de coletivos e artistas negros, ou que se dedicam a temática negra. Além de potencializar as iniciativas empreendedoras comerciais e culturais. Ao longo do ano são realizadas ações com a finalidade de preparar os participantes para o maior aproveitamento das atividades da Feira.



E então, nos vemos por lá?

Dica do Max, via MSN

Racionais MC's e os rumos do rap no Brasil

por Robson Assis | | 2 Comentários

Não é preciso muito para dar mérito ao grupo Racionais MC's. Eles têm uma biografia invejável no rap nacional, gravaram discos que foram sucessos incontestáveis de venda e crítica, sem esbarrar num erro, num beat. E então, caíram no temido século XXI, após a decadência do rap americano, transformado no "estilo hip hop".

A idéia desse texto se deve completamente ao blog Mundo do Rap, um excelente blog crítico sobre rap nacional e que, neste texto de Bruno Rico, me provou o que a algum tempo eu já previa: Os Racionais MC's moldam o cenário rap de acordo com o disco que lançam. Claro que eles não previram isso, nem agem de má-fé, isso seria criar mais uma conspiração em torno do grupo.


Tudo começou com os discos Holocausto Urbano (1990), Escolha seu Caminho (1992) e Raio X do Brasil (1993). É início dos anos 90, pós Diretas, Impeachment de Fernando Collor, o íncio do Brasil piada pronta que temos hoje em dia. Foi dali que surgiram sons mais pesados como Pânico na Zona Sul, Homem na Estrada e Tempos Difíceis, esta última uma excelente música daquelas que não envelhecem nunca, cantada por Edi Rock.

Foi o despontar de grandes nomes como GOG, de Brasília, já com três discos e a mesma temática baseada nas subcondições de vida da periferia, lançando o hit Brasília Periferia em 1994. Da mesma época são os clássicos "Só se Não quiser Ser", do MRN e o "Humildade e Coragem são nossas armas para lutar" de Thaíde e DJ Hum, que tinham na época tanta ou até mais visibilidade que os Racionais.

Nada nesta época era considerado muito inovador e referência, talvez porque os grupos nacionais seguiam à risca a linha do rap criado nos EUA por Grandmaster Flash e popularizado com Public Enemy e NWA. Apesar de tudo, foi uma época um tanto quanto apagada em relação ao que estava por vir. Em paralelo à essa guinada inicial, Gabriel o Pensador, em alta na mídia, cantava rap para a classe média carioca, mas o rap ainda era discriminado, marginalizado e como acontece com qualquer música de protesto, ninguém (ou quase ninguém) dava ouvidos.

SOBREVIVENDO NO INFERNO, O AUGE

Em 1997, o Racionais volta com o disco Sobrevivendo no Inferno, um divisor de águas (o clichê é gratuito) no rap nacional. Foi o impulso que o rap precisava para se impor. Daí pra frente, a periferia tomou espaço na mídia e a música negra ganhou seu merecido e batalhado destaque.

O disco trazia obras primas de até 11 minutos, como Fórmula Mágica da Paz e sons que ganharam o imaginário popular da vida dos presidiários como em Diário de um Detento. Um disco com 12 músicas recheado de protestos velados, letras bem escritas como nunca antes se havia feito.

Os Racionais então reinavam absolutos no cenário rap brasileiro após ganhar o Video Music Brasil na categoria Escolha da Audiência com o clipe Diário de um Detento, em 1998.

Grandes discos foram lançados durante o final da década de 90 e o começo dos anos 2000 como "Versos Sangrentos" e "A Marcha Fúnebre Prossegue", do Facção Central, "Só Sangue Bom" do Realidade Cruel e ainda o fantástico "CPI da Favela", de GOG. O cenário rap ganhou ainda maior notoriedade com Sabotage e sua rima precisa e invocada do disco "Rap é Compromisso", de 2001.

Neste começo de século as coisas andavam muito bem, SNJ e Apocalipse 16 lançavam canções tranquilas com uma positividade inigualável. Xis, Doctor MC's e SP Funk faziam um som dançante e descolado, 509-E despontava como grande descoberta com o excelente Provérbios 13 e o rap ia conquistando cada vez mais espaço na música nacional. Não houve outra época com tantos lançamentos bons e referências pululando das quebradas brasileiras.

INFELIZMENTE, HAVIA UM DIA APÓS O OUTRO DIA

Estávamos chegando perto da Copa do Mundo de 2002 quando o Racionais emplacou mais um clásico: álbum Nada como Um dia após o outro dia, menos introspectivo e pesado que o anterior. As músicas apresentavam um lado bem mais gangsta do grupo, com letras sobre respeito, amigos e a famigerada família Vida Loka dos bonés e carros customizados, influência da cultura mexicana, os Vatos Lokos, como no filme Marcados pelo Sangue.

A morte de Sabotage em 2003 também ajudou para um certo enfraquecimento da música rap em geral neste período. A coisa toda ainda funcionava mas com um certo ritmo decadente, shows esparsos em quadras de escolas de samba, Indie Hip hop lutando com todas as forças e trazendo grandes nomes gringos para os palcos do Sesc Santo André, e então alguma coisa aconteceu: A indústria da black music.

Foi nessa época que ouvi os primeiros comentários de alguém dizer que estava ouvindo hip hop. A parte principal do que me veio à cabeça nessa hora foi: "Não se ouve um movimento". E o Bruno Rico do blog Mundo do Rap faz um ótimo comentário sobre isso em seu texto intitulado "Prevejo a divisão no rap nacional":

"Um grande e simples exemplo do que estou querendo dizer é que hoje em dia o rap americano virou apenas hip hop, as pessoas ouvem hip hop, como elas conseguem eu não sei, mas elas juram que ouvem hip hop."

E então os grupos começaram a fazer rap com uma visão diferente, aproveitando o que o Racionais fez de melhor e adaptando modelos gringos. Dessa época são os discos Falcão, O Bagulho é Doido do MV Bill, Exilado Sim, Preso não do Dexter, Deus do Morro, do Detentos do Rap e Tarja Preta, do Gog.

Veja bem, gosto muito dos discos de rap deste período, mas posso dizer que, nesta época comecei a limar tudo o que ouvia de forma mais crítica. Foi a partir daí que a coisa começou a caminhar mal e seguir caminhos errados, infelizmente, mas isso não quer dizer que todas as músicas da época são ruins, muito pelo contrário, apenas o que a black music da Rihanna, Akon e afins trouxe ao rap nacional

RACIONAIS 2010 E A CONSPIRAÇÃO DO FIM DO RAP DE PROTESTO
No Brasil, a black music começou a expandir como gremilins numa piscina tomando conta de todas as rádios e toques de celular junto com o funk e outras aberrações musicais. Quem começou a curtir rap depois do último disco do Racionais teve uma excelente base do que já havia passdo, afinal, era o exemplo maior do rap com conteúdo revolucionário e prático, mas em doses menores e menos bons artistas para seguir.

O fato é que daí pra frente, ninguém mais quis saber do que o 2Pac falava em suas letras, o que a treta dele com o Notorius BIG trouxe de bom - musicalmente falando - para o rap. Dali pra frente se ouvia falar de Akon, Kanye West e suas devidas roupas e garotas. Tornou-se glamour.

E muito do rap nacional, entrou na dança. As maiores contradições da história do rap despontaram de uns anos pra cá. MV Bill no Faustão, Racionais fazendo música para a Nike, clipe do Pixote com o Helião (RZO), gravado em Paris, na frente da Torre Eifel, falando de quebrada e de humildade. A pergunta é: Para onde estamos indo e o que diabos os artistas estão fazendo do rap?

Sou fã confesso de Racionais e não acredito que eles possam fazer algo tão ruim como tanto vêm especulando os veículos de comunicação, blogs e gente envolvida. Acredito que esse burburinho todo tenha sido causado pela canção "Mulher Elétrica", que fala sobre mulheres e realmente possui uma postura bem mais pop que Mulheres Vulgares, por exemplo e provavelmente pela divulgação da revista Rolling Stone com o Mano Brown na capa.



O próximo disco do Racionais vai cair nas graças do público de qualquer forma, seja ele só dançante, só brutal ou só polêmico. O problema é como ele será encarado pelo rap em si e pela galera que curte de verdade. Minha parca opinião tem um resquício de esperança: prevejo um retorno ao marasmo do começo dos anos 90, mas por um outro lado muita vergonha alheia patrocinada por grandes nomes e comerciais chulos. Para terminar, me lembro de um trecho do filme Quase Famosos, em que o garoto aspirante a jornalista mantém um interessante diálogo com seu mentor, uma homenagem clara ao jornalista crítico mais ácido da história, Lester Bangs. Eles conversam sobre o rock, mas a analogia é válida. Talvez um garoto desses pudesse salvar o rumo da música rap. Talvez:

- Então é você que me manda aqueles artigos feitos para o jornal da escola?
- Tenho enviado umas coisas de fanzines também.
- Como é sua popularidade na escola?
- Eles me odeiam.
- Você vai conhecer muitos deles contra você nessa jornada. Sua escrita é muito boa. É uma pena você ter perdido o rock & roll.
- Perdi?
- Sim, acabou.
- Acabou?
- Acabou. Você chegou a tempo do último chacoalhão da morte, do último suspiro!
- Bem, pelo menos eu estou aqui pra isso.

Música Boa, Poltronas Vazias

por Robson Assis | | 7.12.09 1 Comentário

Na semana passada tive a oportunidade de ver dois grandes shows internacionais com público pagante incrivelmente abaixo do esperado (do meu ponto de vista, é claro). Ficam aí minhas considerações sobre as apresentações, uma delas mundialmente consagrada, outra conhecida por um público mais restrito. São contrastes de estilos e gostos, mas deu pra separar algumas conclusões sobre o fato de que show é show em qualquer lugar, seja os Beatles no Carneggie Hall ou o Cólera no Tendal da Lapa.

THE BEACH BOYS @ Credicard Hall, 02/12/2009
Na quarta-feira (02) aconteceu em SP o show de comemoração aos 40 anos do disco Pet Sounds, segundo melhor disco de todos os tempos de acordo com a lista da Rolling Stone gringa, perdendo apenas para Sgt Pepper's Lonely Heart, dos Beatles, mas isso dá um outro post com toda a discussão.

Galera na frente do Credicard Hall, sem aglomeração, pouca fila, seguranças gentis (talvez pelo fraco movimento). Entramos e pegamos os lugares marcados. Com casa vazia, a organização do evento liberou as poltronas no piso térreo. Pista lotada, ainda ficaram lugares vagos e muita gente lá em cima! Tudo pronto, banda no palco, para uma das melhores apresentações que vi na vida.

Iniciaram o show com um medley de Catch a Wave, Hawaii, Do It Again, Surf City e Surfin Safari e tocaram um repertório escolhido a dedo, com a competência que só uma banda histórica que emplacou hits durante décadas pode ter.

A apresentação seguiu e casais começaram a dançar o surf music ao lado do palco, num clima bem anos 60 para o auge da apresentação, quando o set list começou a mesclar canções do Pet Sounds como Wouldn't it be nice, God Only Knows e Sloop John B, que emocionaram muita gente, acompanhados ainda da fantástica Good Vibrations, com um espetáculo de luzes não menos instigante.

Foi um show tão espetacular como eu esperava e mais mágico do que eu poderia imaginar.

SAMIAM @ Hangar 110, ontem 06/12/2009
O Hangar 110 sempre teve uma história que se confundiu com a história do hardcore nacional. Afinal, foi lá que apareceram muitas bandas boas e promissoras, que hoje, inclusive, garantem seu espaço no maistream e outras que optaram a vida livre e desprendida da música independente.

Era um domingo, de tarde, a rua Rodolfo Miranda cheia, mas não lotada. O ingresso de R$ 60 era muito pra ver uma banda da california que já havia visitado o Brasil antes? Pode ser um motivo. Parei na frente, vi alguns rostos conhecidos e entrei lá pelas 19h. Pouco depois, entra no palco o First Driven, banda legal, que me lembrou Foo Fighters, Hot Water Music e até Samiam mesmo.

Na sequência, ZANDER. E escrevo em caixa alta pois era uma banda da qual eu não esperava tanto e que me surpreendeu como poucas bandas até hoje. Riffs pesados, guitarras numa harmonia brutal e o vocal do Noção de Nada, que dispensa adjetivações. Depois de um tempo indo em shows e frequentando a cena, você entende quando os integrantes de uma banda estão tocando aquilo que gostam e acreditam apenas por vê-los tocar.

Pra finalizar a noite, SAMIAM. Banda da California, tocando o hardcore classe que nasceu e se consagrou por lá. Faz lembrar garotos andando de skate naquele sol, a praia ao fundo e a sensação de poder esquecer o mundo que nada mais importa. Era exatamente esse o clima do show.

Uma boa parte do set list não tinha como errar. Sucessos do Astray, o melhor disco, seriam cantados em coro. Assim se passou com Mexico, Dull e até a lenta Mud Hill. O hit Sunshine foi também alucinante como eu esperava e seria a melhor do show, não fosse um dos stage divers subir no palco e tentar cantar o refrão todo desafinado, roubando o backing vocal do baixista.

Samiam finalizou o show mostrando porque se tornou uma banda referência para o hardcore melódico mundial, com riffs de guitarra marcantes e uma musicalidade muito mais que verdadeira.