O domingo despertava frio na zona sul de São Paulo, de onde saímos. Mesmo com essa cara de chuva que o fim do ano promete, a tarde parecia clarear conforme chegávamos ao ABC, onde acontecia a sétima edição do maior festival de rap alternativo do Brasil, o Indie Hip-Hop, organizado desde 2002 por Rodrigo Brandão (Mamelo Sound System). Do lado de fora, às 18h20, já com o som rolando, uma multidão ainda se aglomerava nos portões do Sesc Santo André, alguns esperando amigos, outros finalizando seus drinks, ou apenas na tentativa desesperadora de conseguir um dos ingressos tão concorridos para o espetáculo.
Na entrada, uma breve revista com seguranças mais tranquilos do que o convencional braço cruzado, cara fechada e "abre-essa-carteira-aí-preu-ver". Uma moça bonita rasgou o ticket enquanto eu a admirava por dentro de seus olhos. Na descida pelo corredor escuro, lembrei de quantas vezes fui em casas de shows menos respeitosas com o público em locais mais elitizados e com funcionários que não se relacionavam como pessoas, com ações robotizadas e pouco humanas. Claro que lembrei disso tudo em duas frações de segundo.
No final da descida, avistei o palco. O Projeto Manada já destrinchava seu repertório dançante e empolgava os presentes que já lotavam metade do espaço destinado ao público. Apresentando o show do disco Urbanidades, lançado neste ano, o grupo abriu o segundo dia da festa, que no sábado contou com Doncesão & Dr Caligari, Sombra (ex-SNJ) e Subsolo. O PM fez um show bastante seguro e muito próximo do público. Segundo o MC Prizma afirma no myspace do grupo, a apresentação "foi o marco de um processo dificil que foi a concepção do disco".
Muito som rolando nas pick-ups após o primeiro show. Dei um tempo do lado de fora, na praça de alimentação. A fila enorme era recompensada pelo encontro com amigos e conhecidos, algumas palavras, o clima era de total coletividade. Algumas cervejas depois, entra em cena o Kamau. Já conhecia seu disco anterior e confesso não ter gostado muito do que ouvi. De qualquer forma, parei para prestar atenção e pude reconhecer o som do cara como algo muito original. Ele lançava também seu disco Non Ducor Duco, de agosto/2008. Batidas e levadas mais pesadas, com uma rima sublime e um tipo de métrica poética bastante particular. Fora isso o cara agitou muito a platéia que já tomava conta de todo o local.
DJ KL Jay tocou antes do nova-iorquino, muitos clássicos, muito rap nacional de qualidade, algumas emendas ótimas, um trabalho de indiscutível qualidade e que todos dançavam sem parar. Entre um som e outro, algumas homenagens ao DJ Primo, que faleceu este ano vítima de pneumonia. Todos aplaudiam e algo de emocionante acontecia dentro de cada um dos presentes, sempre que citavam o nome do DJ.
A noite já dava o ar da graça, quando sobe ao palco Talib Kweli, o norte-americano convidado especial. Já é praxe do festival chamar algum grupo de destaque internacional (em edições anteriores já passaram por lá Hyerogliphics, Jurassic Five e De La Soul) e desta vez, a escolha foi de uma exatidão milimétrica. O rapper que já fez parcerias com Madlib, Mos Def e Hi Tek, além de ser dito o queridinho de Jay-Z fez um set preciso que agitou a galera do início ao fim, sem delongas, sem corpo mole e com muita vibração positiva.
Ao terminar a noite acredito que todo mundo tenha voltado para casa com a sensação de um direito cumprido. Não podemos pagar para ver um Kanye West endeusado, mas podemos ver shows tão bons ou até melhores com a autenticidade de um evento que ano após ano vem ganhando em qualidade e acrescentando muito à cena de hip-hop independente nacional.
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Um comentário:
Programão!
abraço!
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